
O cara narra situações hilárias, nos lugares mais estranhos do planeta e/ou da sua alma.
Recomendo.
Resolução tardia de ano-novo:
A partir de hoje (decidi ontem) só vou me dedicar às exigências da pizzaria após as 13H00min. Isso reduz minha rotina para apenas 12 ou 13 horas diárias, sete dias por semana.
Comecei mal: Acordei muito antes das nove, como pretendia, com uma ligação a cobrar no meu celular. Era o entregador de papel higiênico:
-Seo Celso?
-Dão, César. _Falei surpreso com a voz de pato que saiu de minha boca e com a garganta arranhado também.
-Posso falar com seo Celso?
-Dão dem nenhum Celso aqui. Beu nome é César. Bode ser?
-Ah, seo “Cérzar”, eu to aqui pra entregar seus produtos da Kimberly. O senhor pode abrir o restaurante?
-Dão bai dar. O horário de entrega dão ta escrito aí na nota?
-Tá sim, mas é que eu vim aqui perto...
-E eu to longe. Bolta à tarde.
-Posso deixar na vizinha?
-Dão! Bolta no horário que está aí na porra da nota-biscal!
-O senhor não precisa ficar nervoso.
-Dão precisava mesmo, boi bocê que me deixou assim. Bolta à tarde conforme o combinado com a bendedora.
-Tudo bem então. Obrigado.
-Dão tem de quê.
Olhei pra manhã perfeita e a minha bicicleta na varanda. Tive ímpetos de ignorar o resfriado que se alojou em mim durante a noite, mas fui interrompido em meus planos por uma crise de tosse.
-Dudo bem. Bica bra amanhã. _Grasnei sozinho.
O celular tocou a cobrar novamente:
-Alô!
-Seo "Cérzar"?
-Dão, o César saiu.
-É que...Nada não. Pode deixar.
Há alguns anos, quando eu tinha uns trinta e poucos, época em que li inúmeros e idênticos livros de auto-ajuda, fui levado a concluir que eu era portador de uma baixíssima capacidade de perdão e que essa característica era a grande responsável pela sensação de “fragmentação do meu ser”.
Passei uma década ou mais me “auto-fodendo” por conta da minha suposta inabilidade de perdoar incondicionalmente. As pessoas me ferravam e, não bastante isso, eu me sentia incompleto, pecador e indigno por não conseguir “perdoa-las de coração”.
Hoje, que superei a segunda adolescência (dos 30 aos 40), concluí temporariamente que sou ruim em perdoar os traidores, os fracos, os canalhas, os mentirosos, os hipócritas e assemelhados exatamente porque não aceito esses comportamentos em mim.
Posso culpar ou louvar a inflexibilidade da educação que recebi de meus pais, o código de honra que absorvi de meus irmãos mais velhos que “pastam”, como eu, nas mesmas “campinas da verdade acima de tudo”, mas nenhuma das minhas dores me fará ser complacente comigo mesmo, muito menos com os outros.
Suporto e até convivo com as grandes mancadas e respectivos argumentos e desculpas, as fraquezas confessas ou não, porém de forma intelectual, técnica, mas lá dentro, em meu coração, quem trai, mente ou fraqueja nos negócios, na amizade ou no amor estará destinado ao meu “limbo pessoal”: Daqui pra frente tolero-te, e só.
Li em algum lugar que tolerar é a pior forma de odiar, pois não carrega sequer uma carga de emoção, é apenas desprezo dissimulado em cortesia e uso cuidadoso.
Cruel?
Não é bem assim.
Antes de tudo ofereci minha “amizade fácil e sincera”, como diz meu filho. Nunca prometi ser um babaca de estimação.
Já que ninguém faz um depoimento pra mim no Orkut, fá-lo-ei eu mesmo...
Nota do editor: Esse depoimento é (ou não) uma obra de ficção. As pessoas reais ou imaginárias citadas nesse documento são uma só. Homenageado e homenageante citados aqui como CÉSAR, EU, MIM OU NÓS, autorizaram essa publicação. Qualquer semelhança com fatos e pessoas reais deve-se a uma estranha coincidência, previsível homonimidade ou péssima literatura.
César. O que dizer do César? – (Depoimento no Orkut que se preza começa assim).
Se não fosse por mim, hoje eu não estaria aqui fazendo esse depoimento. Eu sempre estive ao meu lado. Mesmo contrariado, jamais me abandonei. Nos momentos mais significativos de toda minha vida eu estava presente: Sofri comigo, alegrei-me comigo, sonhei comigo e desiludi-me comigo.
São tantos anos, possivelmente encarnações, que caminhamos juntos, mim e eu, que não consigo imaginar um dia a gente se separar. Creia amigo, no dia que formos dessa para melhor, batermos as botas, abotoarmos o paletó de madeira, irei contigo sem discutir ou talvez, só um pouquinho.
Sei que meu carinho e compreensão por mim são incondicionais, às vezes penso que mim e eu somos até mais do que uma única pessoa. Eu perdôo quase tudo que eu me faço e eu, por minha vez, me compreendo e me consolo até nas minhas fraquezas mais sórdidas.
Mim e eu não temos segredos entre nós, nossa vida é um livro aberto e mal escrito, mas nós adoramos reler-me.
Não posso esquecer dos amigos que eu me apresentei. Quase todos gostam tanto de mim quanto de nós. Pensam que somos inseparáveis. É porque não conhecem nossas rusgas secretas. Tem dias que tenho vontade de me estrangular, de ir embora e nunca mais olhar na minha cara, mas nossa unidade é maior e eu perdôo a mim como se o erro fosse meu.
Naqueles dias em que estou pra baixo, depressivo, eu venho em meu socorro e não adianta nada. Quando, porém, eu estou alegre, expansivo, divertido, acabo pondo mais lenha na fogueira e, muitas vezes, passo do limite, o que causa em mim, que sou mais tímido do que eu, certo constrangimento. Que eu me perdoe, não faço para envergonhar-me.
Enfim, querido César, escrevo aqui esse humilde depoimento para dizer muito pouco sobre a enorme importância que eu tenho pra mim. Saiba que meu apreço por mim é tão grande que nem que mil anos se passem, nem que os deuses desçam do Olimpo, nem que o efeito estufa nos torre, jamais me deixarei sozinho.
Conte sempre comigo.
Me amo.
Meu amigo, Eu.
TUDO VIRA BOSTA.
Moacyr Franco.
A buchada e o cabrito
O cinzento e o colorido
A ditadura e o oprimido
Prometido e não cumprido
E o programa do partido
Tudo vira bosta
O vinho branco, a cachaça, o chopp escuro
O herói e o dedo-duro
O grafite lá no muro
Seu cartão e seu seguro
Quem cobrou ou pagou juro
Meu passado e meu futuro
Tudo vira bosta
Um dia depois não me vire as costas
Salvemos nós dois, tudo vira bosta
Filé “minhão”, “champinhão”
Don “perrinhão”, salsichão, arroz, feijão
Muçulmano e cristão
A mercedez e o fuscão
A patroa do patrão
Meu salário e meu tesão
Tudo vira bosta
O pão-de-ló, brevidade da vovó
O foundue, o mocotó
Pavarotti e xororó
Minha eguinha pocotó
Ninguém vai escapar do pó
Sua boca e seu loló
Tudo vira bosta
Um dia depois não me vire as costas
Salvemos nós dois, tudo vira bosta
A rabada, o tutu, o frango assado
O jiló e o quiabo
A prostituta e o deputado
A virtude e o pecado
Esse governo e o passado
Vai você que eu tô cansado
Tudo vira bosta
Um dia depois não me vire as costas
Salvemos nós dois, tudo vira bosta
Nas línguas, sabores
De peles, cabelos.
Tato, quietude, sombra e luz
Isso basta, porque
silenciosamente,
não mentem,
quando sentem.
CAPÍTULO I – O LOUCO.
Quinta-feira, 07/02/2008 – 02H45min.
Li preocupado o e-mail de uma amiga doce e fatalista de manifestações bissextas.
"César querido.
Fiquei feliz em descobrir que você acabou com o jejum de textos novos no seu blog, mas muito preocupada com o conteúdo das últimas postagens.
Você passou o Natal e o Reveillon sozinho, depois fez pouco dos desígnios de Deus, recomendou que os narcisistas se jogassem numa fogueira, usou e abusou do foda-se isso, foda-se aquilo, irritou-se com as chuvas e com o Carnaval e ainda raspou totalmente os cabelos. [...] quero que saiba que compreendo suas angústias até porque já passei, como você bem se lembra, por períodos difíceis e, graças a ajuda profissional, venci meus demônios em poucos meses.[...]
Blá, etc. & tal, conte comigo.
Beijinhos na careca.
C."
CAPÍTULO II – O BONECO.
Quinta feira, 07/02/2008 – 21H50min.
Quando o Lula se preparava para disputar a reeleição encomendei do Edson, um artista catarinense, uma espécie de caricatura tridimensional do nosso ilustre re-presidenciável para decorar o República. Nada mais apropriado para uma pizzaria que tem a política como tema.
Desde que chegou, esse boneco foi surrado e quase esquartejado pelos clientes e ficou tão maltratado e maltrapilho que o escondemos no mezanino. Semana passada, decidi restaura-lo.
Um pouco de paciência e cola-quente farão uma verdadeira plástica em nosso mascote, pensei.
Levei o cabeçudo para casa.
CAPÍTULO III – O ANALISTA.
Domingo, 10/02/2008 – 02H25min.
Noite de Sábado perfeita na pizzaria. Casa cheia, só elogios.
(fonte: Wikpédia)
Isso explica (ou eu forço) a razão de estar aqui às 4 da manhã velando minhas neuroses e fantasias enquanto quem as provocou provavelmente dorme. Dá sentido ainda ao fato de seu nome ser escrito com letras como o meu e de ter nascido no século XX, exatamente como eu.
E as nossas diferenças então... Ah, essas são biologicamente compatíveis! Aleluia! Aleluia!
Confira na próxima postagem.
Em tempo: O ego continua firme e forte. Vide assinatura na ilustração.
-O Paulinho me disse que você tem um blog...
Perguntou o conhecido de muitos anos e recentemente freqüentador cada vez mais assíduo da pizzaria. Ele vinha de uma farra carnavalesca vespertina e passou no República para comer alguma coisa na intenção amenizar os efeitos da bebida que (o) consumiu a tarde toda.
-É verdade. Há quase um ano que escrevo lá.
-Pra que?
-Como assim?
-Pra que você escreve? Qual objetivo? O que você pretende com isso?
-Não sei te responder agora. Talvez possa fazê-lo por escrito, no próprio blog.
Acordei irritado com a pergunta dele e, durante o dia, formulei centenas de respostas, algumas poucas vou colocar nesse post.
Anna Basseto: http://annabasseto.blogspot.com/
Antonio Lino: http://dizquefuiporai.blogspot.com/
Carô: http://porcimadaminhasacada.blogspot.com/
Gio: http://quemundopequeno.blogspot.com/
Y.Y.: http://www.eunaoseitrigonometria.blogspot.com/
FAI ZE VODER!